quarta-feira, 14 de agosto de 2013


A procissão das almas



A procissão das Almas

Acreditam os antigos, e, toda crença se inicia por algum motivo forte, que , de sete em sete anos, na sexta feira santa,  os mortos que não conseguiram entrar no céu, ou morreram naquele dia, saem em procissão, do cemitério até a igreja mais próxima, onde esperam que se abram as portas do paraíso. Verdade? Invenção ? Quem vai saber...

Há muito tempo atrás, o cemitério de Jacareí estava localizado lá na Rua Barão, atrás da antiga Casa Garboci. Quando o novo Campo Santo foi construído,  no bairro do Avarei,  parece que nem todas as ossadas foram transferidas para o novo endereço, logo atrás da secular  Igreja que, também segundo os antigos, foi a primeira a ser construída na antiga vila.
Pois, numa dessas sextas feiras santas, voltando para casa depois da procissão relembrando o Calvário de Jesus, dona Sinhazinha, que morava lá no comecinho da Rua Barão, que então se chamava Rua do Cemitério, perdeu o sono. Abriu a janela de sua sala, que dava diretamente para a rua e viu um estranho movimento: Movendo-se devagar, entoando cânticos e batendo matracas, um novo séquito se aproximava , tomando todo o espaço, até quase nas calçadas. O povo vinha  orando e tocando matracas. Mas, de onde aquela gente saíra? Para onde se dirigia? Pensou e pensou e não conseguiu lembrar-se de nenhuma igreja que ficasse por aqueles lados. Achou curiosa também a vestimenta dos participantes: todos vinham em longas túnicas negras, o rosto coberto por um capuz e segurando grossas velas acesas. Seria uma nova irmandade?
Logo os caminhantes alcançaram sua casa, no que uma moça, saindo do grupo, aproximou-se de dona Sinhazinha, perguntando-lhe se poderia usar o seu lavatório, pois estava muito precisada. Claro que  nossa protagonista deixou a moça entrar, e não apenas a guiou até o banheiro, como ainda segurou  a sua vela. Nesse curto espaço de tempo aproveitou e deu uma bela olhada em seu rosto. Achou a moça bonita, mas muito pálida, coitada!
“Para onde a procissão vai indo?” perguntou, curiosa.
A moça não respondeu. Olhando para a vela acesa disse simplesmente: “Olha, a Senhora pode ficar com a minha vela, que eu agora preciso correr para alcançar meu povo... e, sem esperar resposta, afastou-se. Dona Sinhazinha ainda olhou que direção a procissão tomava. Coisa estranha, viraram a esquina e se dirigiam, pelo descampado, lá pras bandas do Avarei...
O silêncio voltou a reinar naquele seu canto. Só a lua, gigante, iluminava o céu, quando ela fechou porta e janela e retirou-se para dormir.
Na manhã seguinte, saindo de seu quarto para a sala, lembrou-se de guardar a vela para leva-la, depois, até a igreja.  Foi quando estancou no canto apavorada. Mas aquilo não era uma vela! Parecia mais um  fêmur! Pegou nele pra olhar bem de pertinho e confirmou sua cisma. Em suas mãos estava um longo osso humano: branco e frio!
Dona Sinhazinha contou que nem sabe direito como foi que se vestiu e chegou na igreja, mas foi tudo num repente só! Trêmula, foi procurar pelo vigário, mas este havia saído para encomendando um corpo, lá na velha igrejinha do Avarei. Ansiosa, ela resolveu que iria até a outra igreja, encontrar-se com o padre e entregar-lhe aquele osso.  Para casa é que não iria voltar com aquele objeto!
Rapidamente alcançou o pátio da igreja. Entrou em tempo de participar da missa para encomendar aquela alma. Quando chegou perto do caixão, ela quase desmaiou!  O defunto era exatamente a moça que entrou em sua casa e lhe entregou a vela.  Ela estava morta. Mortinha da Silva, ali dentro do caixão...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Este comentário será exibido após aprovação do proprietário.