domingo, 27 de abril de 2014


II Guerra Mundial - Memórias de Eliseu de Oliveira

Pracinha Eliseu de Oliveira
“O pracinha joseense, Eliseu de Oliveira, filho do Sr. Agenor de Oliveira, que por muito tempo foi proprietário do Bar Paulistano, na esquina da Rua 15 de Novembro com a Rua Sebastião Hummel (onde hoje há uma pastelaria) e de Dª Trindade de Oliveira, viveu uma verdadeira epopéia na 2ª Guerra Mundial, pois foi aprisionado, tendo sofrido horrores nos campos de concentração nazistas, a partir do dia 31 de outubro de 1944. Sobre o assunto ele deu depoimento ao jornalista Altino Bondesan, o qual escreveu o livro “Um pracinha no inferno de Hitler”.
“Eliseu de Oliveira, quando foi convocado, era reservista do 4° Regimento de Infantaria e do 6° R.I. de Caçapava, tendo dado baixa das fileiras neste último.
Voltando do 4° R.I, montou com seu primo José Bráulio um armazém no bairro do Sertão, mas foi convocado e seguiu para o 6° R.I. no dia 16 de outubro de 1942. O 6° R.I, tinha o I Batalhão em Taubaté, o II em Caçapava e o III em Lins e, deste, a 8ª Companhia estava em Araçatuba. Ele serviu nesses três Batalhões do Regimento, mas quando a FEB se deslocou para o Rio de Janeiro, ele estava na 3ª Companhia do I Batalhão, do Taubaté.
Embarcou para a Itália no “General W. S. Mann”, navio norte-americano, no dia 29.6.44, indo para Bagnoli depois do desembarque em Nápoles, seguindo depois para Tarquínia e Vada.

Entrou para o front em Filetole, passando mais tarde por Pisa e Chiatre, Piazzano, Santa Maria e, a 23 de setembro de 1944, tomou parte no combate pela posse do Monte Valimona, quando fez parte de uma patrulha e aprisionou quatro alemães. Sua próxima participação foi em Casciano, perto de Luca. Depois esteve em Fornaggi e Borgo Mozzano.
Tomou parte no combate de Barga, na tomada de Colle S. Chirico, tomando, com seu grupo um casarão ali existente, no dia 30.10.1944, posição insustentável, onde, com mais 16 companheiros, foi aprisionado, depois de resistir até o último cartucho, impondo pesadas baixas aos alemães.
No casarão, além dele, estavam o 3° sargento José Carlos Borges, os cabos José Rodrigues (Piolim) e Waldemar Reinaldo Cerezoli e os soldados José Otaviano Soares (Noronha), Osvaldo Maurício Varela, Alcides Ricardini Neves, Anézio Pinto Rosa, Hilário Furlan, Osvaldo Casemiro Muller, Alcides Lourenço da Rocha, Geraldo Flausino Gomes, João Muniz dos Santos, Hamilton Rodrigues da Silva Costa, João Santana (Bigode), Manoel Correa e Antônio Júlio.
Em S. Chirico, o inimigo era tremendamente superior em homens, armas e munições. Com grande dificuldade alguns pelotões da 3ª Companhia do I Batalhão do 6° R.I. conseguiram chegar até seus objetivos. O grupo do sargento Geraldo Moacir Marcondes Cabral conseguiu chegar até uma casa de três pavimentos (embaixo era abrigo de animais, no pavimento do meio havia dois quartos e, no de cima, a sala e mais alguns quartos). Era uma residência rural, cujos três pavimentos tinham saída para terra, por ser entranhado em um barranco.
No dia 30.10.1944, o grupo do sargento Cabral matou alguns alemães e feriu outros tantos, embora perdendo o soldado Vicente Batista, com um tiro na cabeça e mais o soldado Toledo, ferido nos joelhos e, ainda, mais dois soldados que o levaram para a retaguarda.
No dia seguinte, 31.10.1944, os alemães dominaram toda a área. Na casa estavam também os capitães Aldenor da Silva Maia, comandante da 3ª Cia e Atratino Cortes Coutinho, além do tenente José Maria Pinto Duarte, o soldado José Ribeiro Bastos e o Gambá, este gravemente ferido com uma rajada de metralhadora no rosto.
Lá pelas dez horas do dia 31, apareceram para falar com o capitão Aldenor, o cabo Waldemar e soldado Eliseu, cujos companheiros estavam quase totalmente situados no casarão que ficava mais à frente, o que causou espanto a todos, pois parecia impossível que alguém ainda estivesse com vida por lá. Eles vieram para perguntar se deviam ou não permanecer lá. Infelizmente o capitão mandou que permanecessem. O resultado foi a morte do soldado Hamilton Rodrigues da Silva Costa e ferimentos graves no soldado alcunhado Noronha.
Voltando para o casarão, sucedeu a morte do Hamilton e Noronha foi gravemente ferido; João Santana empreendeu bem- sucedida fuga, quando foi ameaçado de fuzilamento. Piolim e Noronha ficaram ocultos, mas depois foram descobertos pelos alemães e levados para a retaguarda, este último estava com 43 estilhaços no corpo.
Disse Eliseu, que no tiroteio travado contra os alemães, cinco deles foram mortos e 25 feridos gravemente.
No fim tiveram de se render e com as mãos sobre a cabeça foram levados a um local e postos em fileira para fuzilamento, porque os alemães estavam furiosos com as baixas sofridas (o local era a área de Castelnuovo no Vale do Rio Sercchio). Por sorte, enquanto os alemães confabulavam a execução, surgiu um oficial nazista que gritou “Brazilianisch incht caputi” (brasileiro não devem morrer) e assim a execução foi suspensa e os brasileiros começaram a transportar os feridos alemães, por quilômetros, debaixo de sol escaldante, depois de 60 horas sem dormir e sem comer, nem beber água.

De Castelnuovo os prisioneiros seguiram para Serrizoli, levando em uma maca o soldado Noronha, ainda com os estilhaços no corpo e sofrendo horrivelmente. Dias depois o médico alemão encheu-lhe a boca de gaze e arrancou a sangue frio o 43 estilhaços. Conta Eliseu, que muitos deles, inclusive o Noronha, quando regressaram ao Brasil, foram a pé cumprir promessa em Aparecida.
Em Serrizoli (PC alemão), os prisioneiros receberam alimentação muito boa, sobra do que comiam os oficiais alemães e, ali, foram interrogados por um tenente que falava o português. O soldado Muller conseguiu esconder sua descendência alemã (ele falava o alemão corretamente) foi de grande valia para os brasileiros presos, traduzindo todas as conversas em que os alemães mofavam dos brasileiros.
Nessa cidade os brasileiros tiveram de trabalhar na conservação de estradas, sob rigoroso inverno e com parca alimentação.
Dali seguiram para Parma, no norte da Itália, onde os brasileiros, juntamente com os alemães, foram bombardeados por avião americano quando o comboio se deslocava. Ficaram alojados na escola dessa cidade italiana e escreveram nas paredes seus nomes, para deixar pista de seus paradeiros aos que viessem a tomar a localidade, pista que teve muito valor quando tropas da FEB entraram ali. De Parma foram para San Giovanni e, no trajeto, foram insultados por italianos tiroleses que lhes atiravam pedras, diziam palavrões, faziam gestos obscenos, chamando-os de “braziliani, raça de cani”. Tiveram de voltar a Parma onde passaram a carregar caminhões de tábuas, as quais lhes machucavam as mãos. Por fim seguiram para Mântua, recebendo bombardeio aéreo pelo caminho e, numa das vezes, tiveram de se esconder atrás de um rico prédio, onde os italianos, seus moradores lhes deram boa comida e vinho espumante.
Em Mântua passaram fome, pois não havia alimentos suficientes. Um oficial alemão descendente de português, chamado Armando lhes dizia que tivessem paciência, pois iam ser transferidos para a grande Alemanha, onde não havia a fome.
fonte:  www.museuvirtualfeb.blogspot.com.br
O campo de prisioneiros de Mântua era cercado de arame eletrificado e os soldados defecavam numa lata dentro das barracas. A cidade era constantemente bombardeada por aviões aliados. Ali os brasileiros foram convidados a falar pelo rádio, concitando os elementos da FEB a se renderem, o que recusaram terminantemente, embora ameaçados de represálias.
Em Mântua partiram de trem cargueiro lacrado, para a Alemanha o qual estava superlotado e trancado a sete chaves, dando solavancos constantes. No caminho o comboio foi atacado por aviões. A viagem durou três dias, dois deles sem alimentos e sem água. Só no 2° dia deram pão preto em pequena quantidade e um pedaço de salsicha. Nesse trem chegaram a Munich e foram para o campo da localidade de Moosburg, no qual iriam sofrer novo Calvário, recebendo alimentação fraca e parca, composta de pacotes enviados pela Cruz Vermelha, mas dos quais os alemães retiravam a maior parte dos alimentos.
Eliseu disse que dali mandara um cartão de boas festas no Natal de 1944, para sua mãe Dona Trindade, mas o mesmo demorou muito a chegar, dando tempo para que recebessem um fajuto telegrama do Ministério da Guerra, dando-o como morto.

De Moosburg vinham trabalhar em Munich removendo neve das ruas e da estação ferroviária. Num barzinho dessa estação trocavam cigarros por xícara de café.

Contou que devido aos constantes ataques da aviação aliada, a cidade de Munich foi transformada em montões de entulho e a tal ponto era o arrasamento que parte da população passou a dormir ao relento. Em Munich os brasileiros servirão também como criados em casas particulares, onde, às vezes recebiam pedaços de pão preto – uma grande dádiva para quem vivia constantemente com fome.
Depois passaram a trabalhar em Lamdsnut, junto ao rio Isar, afluente do Danúbio (em março de 1945).
Um prisioneiro norte americano conseguiu montar um rádio, escrevendo em papel as mensagens que passava aos demais prisioneiros. Essas mensagens contavam o avanço das tropas aliadas em a certeza de que o fim da guerra estava próxima. A disciplina no campo de concentração começou a ser relaxada e agora os brasileiros já podiam pegar água aos baldes.
Em abril de 1945 começou a soar a hora da libertação a cidade de Moosburg começou a ficar deserta e as famílias alemãs começaram a alimentar os prisioneiros.
No dia 28 de abril um prisioneiro sul-africano chegou ofegante, gritando no acampamento: “Domani! Domani saremo in libertá” (amanhã, amanhã estaremos em liberdade).
A alegria tomou conta de todos que dançavam e pulavam de alegria. No dia 29 de abril de 1945, os prisioneiros começaram a ouvir o barulho das armas aliadas das metralhadoras ponto 50; muitos subiram nas partes elevadas das redondezas do campo de concentração e viram surgir no horizonte os primeiros tanques norte americanos do General Patton
Regresso da FEB ao Brasil (foto Internet)
.Os prisioneiros invadiram as barracas dos guardas alemães e de lá retiraram copiosos alimentos fornecidos pela Cruz Vermelha, que eles roubavam, enquanto os prisioneiros passavam fome…
Os soldados norte-americanos chegaram e deram aos prisioneiros alimentos, materiais de higiene pessoal, roupas e dali os retiraram para a França, via Reims até París.
De París, Eliseu falou pelo Rádio e em São José, Baimu ouviu e foi dar a notícia à sua mãe, Dona Trindade.
De Paris, os brasileiros seguiram para Marselha e dali para Pisa na Itália, onde por comboio de caminhões seguiram para Alessandria e Voghera, onde a FEB se preparava para partir rumo a Nápoles de onde dar-se-ia o regresso para o Brasil.” (Cabral,G.M. 1979, pg 47) Visitem também os blogs http://www.portalfeb.com.br/  e http://museuvirtualfeb.blogspot.com.br/ super interessantes e com muitas informações.

Um comentário:

  1. Brasileiros não devem ser mortos - muita sorte haver alguém são dentre os dementes?
    Fome e sede aliados a uma extrema pressão psicológica - verdadeiros heróis os que sobreviveram a esse martírio.

    ResponderExcluir

Este comentário será exibido após aprovação do proprietário.