quinta-feira, 14 de agosto de 2014


Memórias do Sr. Paulo Vicente da Silva (segunda parte)


Corpo Seco, lenda valeparaibana
Eu acredito em alma do outro mundo, porque eu já vi. Eu já fui
assombrado, aqui nessa estrada do Campo Grande. Eu fui guardá um corpo
porque eu sei muita reza pra isso, num lugar meio longe de casa. Então eu andava e apareceu um gemido que me acompanhava. E eu ia pela estrada, e o gemido pelo valo. A senhora sabe o que é valo? É uma divisa de terra que era feita antigamente. E eu rezano... e tudo que eu rezava, respondia lá na vala: “Ai, isso eu também sei”. E eu rezano e veno a casa do defunto, e parecia que quanto mais eu andava, mais eu não saía daquele lugar. Então, depois que eu rezei tudo mesmo que eu sabia, eu me lembrei da reza “25 de março”. Foi o que me salvo, com a graça de Deus. Essa oração 25 de março é muita antiga e a gente só pode usa ela num momento de muita precisão. Dai, quando eu terminei, me empurraro pelas costa, e foi ai que eu consegui chega. Essa reza, que a gente não pode fala a toa, eu aprendi com meu pai, e ele com meu avô. Ela, e muitas outras coisa, eu já estou passando pra uma filha minha que me acompanha sempre, em tudo quanto é festa. Eu tenho certeza que in antes deu morre, eu vou passa tudo que eu sei pra minha familha.
Contador de causo? Eu conheço uns 50 elemento que contam causo muito bem. Eu mesmo tenho muitos causo vivido comigo mesmo, que hoje, se for conta, o pessoal pensa que é mentira da gente, que a gente esta inventando  bobageira, mas é tudo verdadeiro.
Alguma coisa interessante sobre a antiga Jacareí? Ah, eu sei muita coisa. Sei da Santa que jogaram no rio, sei da história do poço do ouro, que é do tempo dos escravo, sei daquela rua que se chamava Cassununga, sabe por quê? Era uma rua que só tinha gente preto que morava ali. Não tinha outra descendência. E ali nóis cantava a folia e tinha leilão, catira, cateretê e a gente fazia paçoca e bolão de fubá. Hoje a rua se chama Salvador Preto.

Ilustração da lenda sobre Nossa Senhora Aparecida, feita por Mestre Justino
A imagem de Nossa Senhora Aparecida? É claro que eu tenho certeza que ela era de Jacareí. Certeza absoluta. Foi quando o Paraíba passava por perto da Igreja da Matriz. Então apareceu um bichão que, conforme meus antepassado assistirum, e minha mãe disse que era pra eu guardá bem a história, que ia
tê um dia que as pessoa ia quere sabe de mim e eu poderia responde a verdade. Então, o bicho foi cavando a terra, e o Paraíba se achegano pra perto da igreja, e a cidade desbarrancano com as casa e tudo. Ai, o padre jogo a image no rio. Jogo como hoje, quando foi amanhã, cesso tudo,como num milagre, e até hoje. Ai, a santa foi rodano, rodano pelo rio até que os pescado pegaro e pescaro ela. E é essa imagem que tá em Aparecida até hoje. E, nos vidro de nossa igreja tem essa história. Pode ir lá ve.

A lavação de santo eu conheço muito. É pra faze chove. Isso nóis fazia muito nos bairro. Fazia e fazemos, e chove mesmo!
É assim: a gente pega a imagem de S. Benedito, e pega uma menina que não pode passa dos seis ano. Tem que se um anjo ainda. Daí a gente manda a menina lavá o santo, e ela vai lavando no riacho ou na bica do rio, enquanto a gente faz as reza, pedindo pra chove. Daí leva a imagem de volta pra igreja,
e in ante dos três dia, pode espera que chove. A gente vai rezano o terço, acompanhano o santo na caminhada e chove. Eu mesmo já vi chover.

Festa da Carpição em Jacareí, foto Internet do blog de Chicoabelhas

Agora, eu vou contá pra senhora um causo acontecido comigo, ali, no fim da Rua do Cassununga. Eu fui numa festa da carpição, no bairro do Pedregulho, que termino de madrugada. Aí eu desapartei da minha companheirada e vim caminhando c'o a minha viola. E eu fui entrano no Cassununga, que tinha poucas casa, quando vi um vulto cavucano um baita buracão. Aí eu pensei que era um assaltante, mas, quando cheguei mais perto, vi que era uma muié que tava ali tapando um buraco. E eu perguntei pra ela: “Mas dona, o que tá enterrando aí? É cachorro? E ela Ah, é cachorro sim, morreu um cachorrinho meu, e eu tô enterrando ele bem aqui. Mas daí, como a justiça divina é tão grande, eu vi a terra se mexê. Eu olhava, e a terra ia se mexeno e a dona com aquele buta vestidão comprido, queria tampá a terra, mas não conseguia.
Nisso, saiu uma mão pra fora. Saltô uma mão pra fora, e a dona saiu correndo, e eu peguei na mão e puxei.
Sabe o que tava lá? Era uma criança de uns quatro ano, que já tava ficando preto. E o buracão que a muié tinha feito era tão grande, que precisava vê!
Daí, perto tinha um corgo sujo que passava, e foi onde eu lavei a criança e ela voltou. Então eu corri com a criança até a segunda casa, onde morava um senhor de nome Benedito Eloi, um barbeiro, que me vendo disse:
“Mas você aí, nessa escuridão, com a viola, tudo sujo de barro e com essa criança nos braço.., ocê tá bêbado?”
“Eu não! respondi.” “Ô seu Eloi, ocê sabe que eu num bebo!”
“Então, o que é que há?”
“É eu que tirei essa criança que a mulé tava enterrano viva!”
Aí ele num acredito e nói vortemo lá pra vê, ele viu mesmo que era pura verdade. A mãe da criança era solteira, e vivia no cargo de um senhor que largo ela e foi-se embora; e eu, peguei e levei a criança pra mim. Daí, no outro dia, ela foi até minha casa pra pegá essa criança, e me pediu pra não dá parte dela.
Eu falei que não ia mesmo dá parte, porque a criança graças a Deus tava viva, mas que eu não ia entrega pra ela não, porque ela não era humana, era um monstro!
Então nóis peguemo aquela discussão, e o povo foi se achegando, foi quando eu fui obrigado a da parte dela pra otoridade. A polícia me deu muita cobertura, e eu fiquei com esse menino, que levei pra minha mãe cria, porque eu inda era soltero. Mas essa criança só foi até os 15 ano. Num viveu mai.
O nome da mulé era Maria das Dores, e ela foi-se embora de Jacareí.

http://youtu.be/Tgh1Z8qYtPs

Um comentário:

  1. Causos e mais causos.
    Rolando Boldrin conhece muitos deles e o Paulo Vicente com certeza não fica atrás.
    A compilação de todos esses causos daria um ótimo livro.

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