segunda-feira, 18 de agosto de 2014


Memórias do Sr Paulo Vicente da Silva (final)

Mapa das lendas brasileiras
Entrevistar o Sr. Paulo Vicente da Silva foi como ter uma fantástica aula de folclore com o melhor dos professores, pois o Sr. Paulo o vivenciava em seu dia-a-dia.  Seus causos, ricos em detalhes, suas receitas de família, sua devoção deixaram em mim a certeza de que a cultura popular é uma fonte inesgotável de saber dessa nossa gente valeparaibana: nosso maior patrimônio! Meu desejo e a minha esperança é que os jovens prossigam pesquisando e documentando o folclore de nossa região, para manter sempre viva esta preciosa memória. E agora, transcrevo para vocês a última parte desse rico depoimento. (Ludmila)


ervas medicinais (imagem Internet)
 Poço de Ouro? Conheço sim, senhora, e até posso levá qualqué um que quisé ve lá. Os poço de ouro surgiro no tempo em que havia os escravo. Era um tempo de judiação. Então os fazendero fazia os escravo carregá aquele baita malão de dinheiro no lombo até chega no lugar escolhido. Daí eles obrigava o negro cavá um poço bem fundo e enterrava o malão nele. Aí, pros escravos não conta onde era, eles matava os coitado e enterrava junto, no mesmo luga do dinheiro. Então, essa riqueza é uma coisa muito difícil de tirá, porque esses lugar são tudo  amaldiçoado. A alma do escravo tá lá, tomando conta daquilo.
Um dia, uns conhecido meu, viero me busca pra nóis cavocá e eu fui. Quando deu meia noite e meia, uma hora, começô uma ventania tão grande, mai tão grande, que nóis perdemo todo o serviço. E se a senhora quisé, eu trago aqui gente que foi comigo, que pode prova que isso é verdade verdadeira! Eu sei de gente que já conseguiu tira dinheiro de dentro do buraco assim, num luga longe daqui, mas perdero tudo.
Olho gordo? Claro que eu acredito! Tem gente que tem inveja, que tem orgulho dos otro, então atrapalha. Eu sempre falo pros meus fio: ocês façam a caridade, que ocês ganha a salvação. Se não pude faze o bem, não façam o mal pra ninguém.

Medicina Popular: Preparando infusões (Imagem Internet)
Médico, farmácia! Ah... é difíci eu i na farmácia. Só vou lá quando Deus permite. Eu trato meus fio, tudo cos remédio que eu mesmo preparo aqui em casa. Eu curo os que precisam, com os meus remédio e com oração.
Eu tenho reza pra cachorro brabo, pra vaca braba. Eu corto caxumba, dor de dente. Eu faço oração pra mulher que fica num inferno pra ter nenê com o parto amarrado. Então eu desato tudo isso.
Receita de remédio?
Dou pra senhora, a qual a senhora quisé. Agora tem quatro tipo de doença: uma que os remédio resolve, outra que só se cura com simpatia, outra que precisa de uma benzeção e tem alguma ainda que um bom susto também resolve.

Mdicina Popular: Benzedeiras (imagem Internet)
Toma nota aí: pra curá bichas desconfiada: fervê um bucado de erva Santa Maria e mistura com leite de peito de 3 mulé de nome Maria. Dá uma colheradinha pras criança de hora em hora.
Pra mordida de vespa: fazê um cataplasma com barro de beira de valeta. Se não tivé, botá em cima da picada, fumo de rolo mascado.
Pra lumbriga: chá de hortelã preta com chifre de boi queimado e um pouco de pacová macetado. Fais e dá pra criança bebê.
Pra curá pulmão: cozinhá  um pouco de agrião com açúcar até virar melado. Se tomá aos pouco, fecha o pulmão.
Pra sarna: tomá salsa panda e lavá o corpo com sabão de cinza.
Pra secá ferida de sarampo: passá  as semente de urucú maduro nas ferida do sarampo, que seca.
Qué mais? Se a senhora tivé tempo a gente fica por aqui mais de um dia entero e as receita num acába ...”

Um comentário:

  1. Neste mundão nosso há saberes e saberes.
    No mato vou querer a companhia desse matuto e não a de um doutor formado em Harvard, Sorbonne ou outra famosa universidade qualquer.

    Falas que se há de respeitar:
    Se não pude faze o bem não façam o mal pra ninguém
    Eu trato meus fios tudo cos remédio que eu mesmo preparo em casa

    ResponderExcluir

Este comentário será exibido após aprovação do proprietário.