Rosália de Oliveira Branco |
Os pais de meu pai e de minha mãe eram nascidos aqui.
Meu pai chamava-se Salvador de Oliveira Branco, mais conhecido na cidade como Vadô Branco. Ele era filho de José Branco de Oliveira e de Joana Maria da Conceição.
O meu avô era muito bonito, claro, de olhos azuis. Ele faleceu com 126 anos, lá nas terras dele, onde era a fábrica da Lavalpa. Antes disso, ele morava no Bairro do Poço.
A minha avó chamava-se Joana Maria da Conceição. Meu pai era um homem forte, muito bonito e trabalhador. Ele era muito simples, analfabeto, mas tinha boas amizades, era muito querido. Ele morreu com 82 anos. Não lembro a data em que ele nasceu, mas sei que ainda tinha os escravos.
Minha mãe chamava-se Virgilina Maria da Conceição. O pai dela era José Bertolino de Morais e a mãe era Francisca da Conceição.
Minha avó Francisca casou com um homem muito ruim, que foi pra guerra do Paraguai e não voltou mais.
Largo do Avareí |
Ele vendeu a fazenda e viemos para a cidade, morar na Rua de Baixo (hoje Luiz Simon). Nossa casa era de esquina, muito grande, tinha uma porção de quartos e uma sala enorme. Moramos lá alguns anos, depois, mais ou menos em 1918, 1919, papai vendeu a casa e comprou uma chácara onde hoje é o bairro Jardim Leonídia. Tinha o Rio Paraíba de um lado, e de resto, era tudo pasto. A casa ficava na esquina oposta ao Hotel Piaza. Papai criava muito gado ali.
o "Esmaga Sapo" |
residencia do Sr. Agostinho Paiva, tio de Dr. Celso Paiva |
A ponte era muito feia, de metal e o resto do bairro era só pastos.
As recordações de minha infância são todas tristes. A gente trabalhava muito, quase não saía pra nada. Tanto meu pai como minha mãe eram muito severos e a vida bastante sacrificada. Lembro que meu pai ia a cavalo pro litoral. Atravessava a serra a cavalo. Pousava na Serra e então descia pro
litoral. Dizia pra gente que era uma viagem muito perigosa, que não dava pra levar a família. Eu mesma só conheci a praia com seis, sete anos de casada, já com quatro, cinco filhos...
Quando eu completei 12 anos, eu entrei na escola, no grupo escolar Carlos Porto, onde eu aprendi um pouco. O nome de minha professora era D. Cássia. Nessa época, a gente morava na Rua Luiz Simon, no fim dessa rua, perto do Santo Cruzeiro. Eu passava todos os dias pela casa de comércio do Mercadante. Lembro muito da Bolívia Zonzini, que foi amiga de minha irmã, da Clarinda. Eu lembro que as duas puxavam junto a fila da escola. Eram tão bonitinhas! A Bolívia era branquinha, branquinha, magrelinha, tinha o cabelo liso, cortado na altura do queixo. O pai dela colocou o nome dos estados da América nos filhos todos.
Eu não tinha amigas, não saía. O passeio era ir até a missa e da missa voltar pra casa. O serviço de casa era muito. A gente socava café, canjica, naquele pilãozinho (aponta o pilão no canto da sala). A gente tinha que buscar água no Rio Paraíba. Muitas pessoas também tinham poço em suas casas.
Grupo de cavaleiros no início do séc passado |
Eu tinha uma amiguinha que se chamava Cotinha. Ela morava no Avareí e era um pouco mais nova do que eu. Aí, quando ela tinha 14 pra 15 anos, ela começou a gostar do Zé Theodoro de Siqueira. Ela namorou um pouco com ele, mas não queria casar. Naquele tempo, as moças casavam com 15, 16 anos. Era costume. Foi quando eu o conheci. Nós namoramos só três meses e já casamos. Foi em 1920, no dia 1º de maio. Meu casamento foi igual a um batizado. Não teve festa nenhuma, porque minha sogra tinha morrido 15 dias antes e os convites do casamento já estavam todos distribuídos. O José Theodoro era de uma família de Salesópolis. Era de uma família muito grande também.
Rua Rui Barbosa |
E dá para apaixonar em três meses? Naquele tempo não tinha disso de as pessoas se apaixonarem. A moça olhava o rapaz duas, três vezes e já era pedida em casamento e logo já ia pro altar. Eu casei mesmo por influência da minha mãe. Ela preocupava-se demais com aquele monte de filhas...que podia morrer antes de meu pai, que ele ia colocar outra mulher em casa, que podia não ter paciência com a gente. Então queria nos ver todas casadas, logo, logo!
Bom, a gente se casou e fomos morar lá onde hoje é o Banco Real. A casinha era feinha, tinha um portãozinho todo cheio de mato em volta, e aquela terra mole, afundando. Os terrenos lá não tinham nenhum valor! Moramos ali até 1925, 1926. Com muito trabalho e as economias, compramos uma chácara muito bonita, cheia de morros, na casa onde ainda eu moro.
Beco do Caranguejo ou do Marreli. As terras da chácara de Dona Rosália ficavam atrás |
Quando as crianças ficavam doentes, a gente levava para a farmácia do seu Rodolfo de Siqueira, pai do Américo e do Odilon. Era uma farmácia muito boa, grande, e era o seu Rodolfo que receitava os remédios. Tinha um médico, o Dr. Novaes, que já era velho, meio careca, e morava na esquina da Lúcio Malta, onde depois morou o Dr. Vergueiro, mas quem resolvia os problemas das crianças era mesmo o seu Rodolfo.
Eu me lembro muito bem da gripe espanhola aqui em Jacareí. Foi um horror! Morria tanta gente que nem dava tempo de enterrar.
Minha vida de casada também foi muito dura, tão dura quanto a de solteira. Criei meus onze filhos sem a ajuda de ninguém. Levantava às 4 horas da madrugada, fizesse chuva ou sol, para tirar leite. Um pouco antes, dava de mamar para a criança. Quantas vezes não encontrei meus filhos debaixo da cama, cansados de chorar... quantas vezes não tirei do chiqueiro, todos sujos, indo atrás de mim. Era uma vida muito triste. Só ter filhos e trabalhar. O marido não queria nem saber! Todas as mulheres levavam essa vida sacrificada: tirando leite, fazendo queijo, olhando as crianças. A mulher, na verdade, era uma empregada do marido. Eles vestiam-se bem, terno de linho bem passado, arreavam seu bonito cavalo, vinham pra cidade e só voltavam no dia seguinte...
E o que eles faziam? Perguntei. Sabe lá Deus! foi a resposta.
Eu tive um irmão, o Cesário de Oliveira Branco, que foi um homem muito rico. Ele teve um enorme depósito de madeira e uma serraria ali onde hoje é a Rua Ramira Cabral. A central (Estrada de Ferro) entrava na serraria dele para descarregar aquelas toras imensas de madeira. Ele teve fábrica de meias, várias casas. Depois, deu um revertério na vida dele e acabou na miséria. Perdeu tudo.
Serraria Conceição |
Rua Alfredo Schurig enfeitada para a Festa da Conceição |
Tinha o Carnaval também. No Carnaval as festas aconteciam no Largo da Matriz. Era uma brincadeira com muita lama, perfume e confete. Mamãe não deixava a gente ir, não. Era muita confusão! Sabe, minha filha, eu não tenho saudade nenhuma daqueles tempos! Prefiro a vida como ela é agora!”
E assim ia se formando a população jacareiense.
ResponderExcluirVida dura, sem infância!
Da.Rosaria,avo da minha amiga Marilena Masiero Paris....Lendo sua história,lembrei-me de minha mãe que hj estaria fazendo 106 anos e ,que conheceu esta senhora e teve uma vida parecida....
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