quarta-feira, 25 de junho de 2014


Memórias do Dr. Ramon Ortiz (final)

Interior da Igreja Matriz de Jacareí

Pintura de Nossa Senhora da Conceição na abóboda da matriz de Jacareí
O que tenho a dizer sobre a lenda de Nossa Senhora Aparecida?
Bem, ela é conhecida por todos e hoje se perpetua num vitral que está na Matriz.
A origem deste vitral foi a seguinte. Eu observei que, entre o povo, se falava que a imagem de Nossa Senhora Aparecida saiu de Jacareí, pelas seguintes razões:
Jacareí era a única cidade que estava a montante de Aparecida pelo Rio Paraíba.
Era a única cidade cuja padroeira é a Nossa Senhora da Conceição, imagem que está depositada no altar da Matriz.
E havia a tradição que falava que alguém jogou a imagem da padroeira no Paraíba porque havia um monstro que devorava os animais e até as crianças, e que se escondia no rio.
Então, naquela devoção ingênua, simples, do povo, acharam que jogando uma imagem nas águas poderiam acabar com o problema. Esta era a fé do povo daquele tempo. E isso foi feito. O fato circulava como notícia entre os antigos de Jacareí. Assim, certo dia, lendo o jornal “O Estado de São Paulo”, qual não foi minha surpresa ao encontrar nele uma crônica escrita a esse respeito. A partir daí, me veio a ideia de deixar o fato perpetuado de alguma forma. Tomei a crônica, fui a Casa Conrado, em S. Paulo, que é a maior casa de vitrais ainda hoje e pedi para falar com o desenhista. Veio atender-me um moço inteligente, muito vivaz, ao qual mostrei a crônica, pedindo que a reproduzisse num vitral e ele fez este que está na Matriz, guardando uma tradição antiguíssima, que, encontrou tanta base, que o próprio “Estado de S. Paulo” publicou.

Vitrais da Igreja da Matriz
um dos vitrais da nossa Igreja Matriz, confeccionado a pedido do Padre Ramon Ortiz.
 ilustrando a lenda da aparição de N.S. Aparecida. Foto cedida por Rosalina Ramalho
Agora, que a imagem de Nossa Senhora Aparecida é a imagem de Nossa Senhora da Conceição não existe nenhuma dúvida, porque o distintivo da imagem de Nossa Senhora da Conceição é o que tem embaixo a Lua e os Anjos, reproduzindo um trecho do Apocalipse que diz: “e apareceu no céu uma mulher vestida de Sol, enfeitada de Estrelas, tendo nos pés a Lua e as Nuvens”. E, é isso que a imagem reproduz. A imagem, porém, e disso não podemos nos esquecer nunca, é apenas um objeto material. O que se quer, pela imagem, é ter-se a ideia do que ela representa. E aquela figura representa a Virgem Maria. Então, na época, essa figura foi encontrada em circunstâncias bem estranhas. Duas redadas. Numa, veio a cabeça, noutra, o corpo. Não havia pesca alguma e, em seguida, a pesca foi tão abundante que nem puderam carregar para terra todos os peixes. Assim, o povo passou a venerar aquela imagem, que foi um objeto, pelo qual a devoção a Nossa Senhora se incentivou, se incendiou, se animou e se divulgou e isto realmente é de grande importância.
Imagem original de Nossa Senhora Aparecida, sem o manto


Raro Mapa das Vilas de  Taubaté e Pindamonhangaba onde aparece o croqui da primitiva igreja de N.S. Aparecida
A validade histórica de lenda existe. Ela consta dos livros de ata de Guaratinguetá. Em 1717, quando passava pela região o Conde de Assumar, que era o encarregado do Governo das Minas, e que ia a Vila Rica, passando por Guaratinguetá, quiseram oferecer-lhe um banquete. A época era de quaresma e o banquete, segundo a tradição, deveria ser de peixes. Assim, foram pescar e deu-se o fato, que está transcrito com data, nome dos pescadores, convidados e comitiva do Conde.
 Padre Ramon, por ocasião de minha pesquisa sobre a lenda, aconteceram alguns desencontros quanto às datas. Alguns de meus entrevistados entenderam como milagre atribuído a Santa, o desvio das águas do Paraíba pela família Leitão. Acontece que o referido desvio é bem posterior (quase um século depois) ao encontro nas águas da imagem de Aparecida. O senhor poderia nos esclarecer a respeito? pergunto.
De fato, o desvio aconteceu e foi muito posterior.

Ilustração para a lenda feita em nanquim por Mestre Justino, de Taubaté
Quanto à tradição ouvida, e lida nas páginas do jornal, era que existia em nosso rio um monstro, possivelmente até um jacaré — animal bastante feroz, que assustava a população ribeirinha. Então, na simplicidade da devoção daquela gente, jogaram uma imagem nas águas para que acabasse o perigo. A imagem foi pescada em Aparecida e este fato já é uma tradição, é um fato que persiste mais do que a lenda.

Igreja de Santa Cruz dos Lázaros
Padre, e quanto à Capela de Santa Cruz dos Lázaros?
Foi por volta do ano de 1900, que o Sr. José Pereira fundou a primitiva capela, cuja Cruz original ainda se encontra na edícula ao lado. Esta capela marcou uma época terrível, em que a lepra não tinha médico-hospitalar; assim, leprosos vindos de cidades vizinhas para esmolar  - os doentes eram
sempre mendigos e viviam da caridade pública - instalavam-se aqui, junto à Água Espraiada, donde originou-se o nome da capela: Santa Cruz dos Lázaros. Este era um lugar ermo, evitado e afastado da cidade, que possuía um Lazareto ali, detrás da Gates, hoje extinto. Atualmente, a Capela foi toda reformada, reforma esta custeada pelo Dr. Roland Chedid Abeyche, e nela existe, com regularidade, ofício religioso muito procurado pela devoção popular.
Como vivo, atualmente?
Bem, talvez possa parecer a muitos que eu durma de dia e descanse à noite, mas, não é bem assim, não!
Embora eu aproveite algumas horas de lazer, eu também tenho bastantes ocupações. Auxilio meus colegas na medida que vêm me procurar. Estou frequentemente ocupado, sempre tenho afazeres. O tempo que me resta, eu dedico a esta chácara, a terra, às plantas. Depois, eu leio e estudo sempre e muito. A mensagem que deixarei ao povo de Jacareí será referente à Aparecida, já que falamos muito a seu respeito. Essa mensagem, que seja então a seguinte:
Em vista de tudo o que ocorreu, de tudo que se passou, que o milagre da Virgem seja um fino estímulo para a maior devoção a Nossa Senhora, que nós evocamos sob o nome de Aparecida.
A segunda parte da mensagem será para que haja sempre gosto, interesse e verdadeiro amor pelas tradições, coisas, objetos e fatos de nossa história; e a terceira, e última parte, será para que haja sempre em nossa casa, uma visita tão simpática e agradável como a que tivemos hoje.”
Padre Ramon, nós é que temos muito a lhe agradecer pelo carinho e atenção com que fomos recebidos e tratados, pelo calor humano e sabedoria que nos transmitiu, e nos despedimos do senhor, com um pedido: lembre-se de nós em seus momentos de meditação e prece. Obrigada pela entrevista!


Memórias do Dr. Ramon Ortiz ( Parte II)

Debret, Largo do Avareí, Jacareí
Igreja do Avareí, antes da reforma

"Falemos agora do Avareí", eu peço. O Avareí, no meu modo de ver, é algo de mais expressivo que existe em Jacareí. Falta documento escrito para provar que é a Igreja mais antiga da cidade, mas existe uma pintura célebre de Debret que a retrata tal e qual é ainda hoje. Uma coisa, porém, é absolutamente certa: Avareí significa - Abarei - ou seja, água de Abaré. Abaré, na língua indígena, quer dizer Missionário;
tanto que, no litoral sul, em Itanhaém, existem umas relíquias notabilíssimas chamadas de Abaré-bebe. Este abaré era um missionário que caminhava muito depressa, ou seja, o missionário-voador. Tratava-se do padre Leonardo Nunes que por lá esteve na época de Anchieta. Fazendo-se analogia, veremos que o Abarei será a Água do Abaré. Por quê?
Sabemos que no Avareí existia um córrego que desaguava no Paraíba, e foi ali que entrou a canoa do nosso primeiro missionário. Por isso, o nome. Por isso, temos tudo para acreditar que lá começava a vida religiosa de nossa cidade. Esse córrego existe hoje, canalizado, irrigando ainda a Escola Profissional.

Igreja Nossa Senhora do Carmo
“O que o Sr. sabe sobre a Igreja de Nossa Senhora do Carmo? pergunto.”
Sei que ela foi um templo tradicional em Jacareí, que ficava ali, no alto da Rua Pompílio Mercadante, anteriormente chamada de Rua do Carmo, exatamente por causa da igreja. Ela foi denominada para ser reconstruída logo a seguir; mas o tempo foi passando e, até hoje, isto não ocorreu.
Construir-se uma igreja, hoje em dia, é muito trabalho, mas apesar das dificuldades, guardo ainda a esperança de que, alguém, algum dia, tenha a feliz ideia de reerguê-la.

Mestre Zezinho
“E sobre as danças populares, Dr. Ramon, que a Igreja, antigamente, não via com muita simpatia, o que o Sr. pensa?”
Eu acompanhei, na cidade, sempre com muito interesse e grande simpatia, as danças de Moçambique. Ate hoje eu gosto de vê-las, pois se trata de um tipo de folclore muito natural e muito espontâneo, de religiosidade pura do povo. Houve época em que esse tipo de 'manifestação religiosa’ sofreu certa oposição. Queriam acabar com essa dança, como já haviam feito com a festa do Divino e eu sempre lutei para preservá-la, para dar continuidade às tradições populares. Moçambique é uma dança de divertimento e religião que eu sempre apreciei por sua ingenuidade e sua beleza. Recordo-me até de um versinho que se cantava assim:
“Que encontro bonito tivemos agora
São Benedito com Nossa Senhora...”

festa do Divino em Jacareí
Festa do Divino em Jacareí

Festa do Divino em Jacareí
Por falar em festas populares, gostei de ver, dona Ludmila, seu interesse pelo folclore de Jacareí, e acho que a senhora deve continuar neste caminho, lutando por nossas tradições... (segue)

Grupo de Folia de Reis

sexta-feira, 20 de junho de 2014


Memórias do Padre Dr. Ramon Ortiz


Padre Dr. Ramon Ortiz
Tendo a chácara por cenário, incrustada na vegetação e enriquecida pela simplicidade da mesa posta (café, garapa, bolo e biscoito), encontramos, eu e o Sr. Odilon de Siqueira, o padre Dr. Ramon Ortiz, tranquilo, entre retratos, livros e lembranças, envolto por aquela aura de magnetismo, que lhe era peculiar e que cativava ao primeiro contato.
“O que levaria um jovem a optar pela vida religiosa? perguntei.”
 Eu nasci aqui mesmo, no Vale do Paraíba, aos 17 de outubro de 1902, em Taubaté. Por aí a Sra. pode ver que já sou um pouco antigo. Vim a Jacareí em 1945. Tomei posse, nesta cidade, da paróquia da Imaculada Conceição - a única que havia, em 6 de janeiro, dia da Boa Estrela, e sempre me dei muito bem por aqui.
Jacareí, "naquele tempo”, era uma cidade relativamente pequena. Calculava-se a população entre 25 e 30 mil habitantes ao todo. Vê-se, por aí, como a cidade se desenvolveu. De um lugar tranquilo, provinciano, aconchegante, passou a grande centro industrial com toda a agitação e movimentos peculiares a essa condição.
entrevista gravada com o padre Ramon Ortiz em outubro de 1979
Se eu nasci com a vocação para o sacerdócio, não me lembro; mas ainda menino, em Jambeiro, minha cidade natal, eu já me dedicava ao serviço da Igreja. Certo dia, apareceu por lá, o celebre bispo de Taubaté - D. Epaminondas - que me convidou a ir para o Seminário. Falou com meus pais e ficou tudo assente. Corria o ano de 1912. Fui para o Seminário de Taubaté, onde fiz o curso superior e me ordenei em 1925. Alguns anos depois de ordenado, fui a Roma. Segui na Universidade Gregoriana o curso de Direito Canônico, onde me bacharelei e licenciei-me. Entretanto, devido à guerra, fui obrigado a retornar ao Brasil, porque realmente eu não queria ficar lá durante a guerra. Passar cinco anos na Europa, que foi o tempo que durou a guerra, eu realmente não desejava.
Voltei, sem plano de continuar meus estudos. Mais tarde, tive a oportunidade de conhecer alguns padres canadenses, que vieram a São Paulo, e aos quais me liguei por laços de grande amizade. Assim, quando eles retornaram ao Canadá, fizeram questão de que eu também fosse. Fui e me inscrevi num curso de doutorado na Universidade de Quebec, e foi lá que me doutorei em Direito Canônico.
Direito Canônico é o direito que rege a Igreja nas suas relações particulares - Direito Privado - e nas suas relações com as outras entidades, com as nações. Eu fui advogado da Igreja na Cúria de São Paulo, e fui também juiz, no Tribunal Eclesiástico de São Paulo.
Lecionei na PUC - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde eu tenho inúmeros trabalhos publicados, porque eu fui também o diretor de sua revista durante doze anos.


Mas, voltemos a Jacareí de 1945. Quando aqui cheguei, a política estava nas mãos do Sr. Odilon de Siqueira - prefeito. O juiz de direito era o Dr.Paulo de Oliveira Costa, e o promotor, o Dr. Armando de Azevedo. O médico da cidade era o Dr. Pompílio Mercadante, figura muito querida de todos, e já me recordo do Jarbas e sua farmácia.
O relacionamento do pastor com seu rebanho era bem mais familiar. A gente tinha mais contato com as pessoas, porque a cidade era pequena, havia pouca gente de fora, todos eram conhecidos e formavam quase que uma única família. Hoje é diferente. O relacionamento é mais do tipo de organização, que é como a época exige.


Mas, naqueles tempos, havia um costume em voga no Brasil, no mês de dezembro, mês dos Presépios, que era o das Pastorinhas. Eu cheguei a formar um grupo de Pastorinhas, em Jacareí, que não progrediu muito porque eu era só, e a paróquia já crescia e me exigia muito. Era um grupo de meninas que cantava e ia visitando os presépios. Aliás, havia aqui um, que era famoso e muito visitado. Era o presépio da família Maciel, organizado por dona Sinhazinha Maciel, em frente à farmácia do pai do Sr. Odilon de Siqueira, na antiga Rua Direita, hoje Rua Antonio Afonso. Era o que de maravilhoso poderia se ver em matéria de presépio, aqui, quando cada família construía o seu. A família Maciel conservava o ano inteiro, e o ano inteiro aquela residência recebia visitas. Alias, na época, era comum as famílias se esmerarem na construção de seus presépios, para ver quem conseguiria confeccionar o mais belo e o mais interessante. Minha mãe, aqui nesta casa, também fazia o seu, do qual eu ainda guardo uma lembrança ate hoje. No seu último ano de vida, ela o armou numa caixinha que vou lhes mostrar, com suas peças originais. A devoção do povo aos presépios, naqueles tempos, era fabulosa. Hoje, rara é a casa que ainda monta o seu, não é? (continua...)

domingo, 8 de junho de 2014


Memórias do Prof. Mário Moras (final)

Comemoração dos 75 anos do Grupo Escolar Cel. Carlos Porto: Prof Mário Moraes à direira e Dr. Walter Francisco (dentista da escola) à esquerda.

O que marcou muito a minha juventude foram as festas religiosas: A Festa do Divino trazia sempre um casal de reis e era sempre um casal de crianças que saía. Havia a novena do Espírito Santo e o encerramento era com uma procissão. Antes de ser desta maneira, faziam a bandeira do Divino correr a cidade e, na casa dos festeiros, havia café com biscoitos servido para todo mundo.







As festas da Semana Santa seguiam o ritual antigo, com solenidades de manhã e à noite.  Acontecia nessa época a Procissão do Fogaréu. As pessoas saíam da Matriz e vinham cantando a ladainha de Todos os Santos com tochas, com tocheiros de querosene protegidas por vidro. Elas caminhavam em passo apressado e subiam a Corneteiro de Jesus. Vinham trazendo a imagem do Senhor dos Passos. O passo apressado era para simbolizar quando Jesus saiu com a cruz, foi uma coisa atropelada, correndo, então a tradição era a procissão à noite, com as tochas e com todos apressados. Havia em Jacareí, no centro, todos os Passos da Paixão marcados. Ali, no Marcolino, havia um Passo. Perto do Cine Rio Branco, havia outro. Na Corneteiro de Jesus, na subida, também havia um. Em cada Passo, era armado um altar, na porta de uma residência, sempre com a imagem  do Senhor dos Passos. O padre fazia uma oração e o coro cantava a música apropriada e a procissão seguia em diante. A imagem do Senhor Ressuscitado era carregada por homens fortes: o Aureliano Moreira, o Maneco Ivo. Essa imagem foi presente do Alfredo Schurig. A base é de pedra que veio da Alemanha e pesava muito.
Papai gostava muito de teatro, do qual, inclusive, ele participava.
Havia aqui um Teatro Municipal, onde hoje está a Casas Pernambucanas. Papai participava também, bastante, do Carnaval. Ele saía sempre fantasiado de mulher.



Clube Esperança
A primeira rua que recebeu calçamento de paralelepípedos foi a Alfredo Schurig, na gestão do Coronel João Ferraz. A Praça Conde de Frontin chamava-se Praça do Bom Sucesso e era um descampado todo alagado. Na revolução, mudaram o nome para Praça João Pessoa. Lá não tinha casarão algum e nem jardim. Depois foi feito um monumento ao Expedicionário, doado pelo embaixador Macedo Soares. Então é que plantaram as árvores.
Jacareí tinha muitos problemas com as enchentes e também com a falta de água. Às 8 horas da noite, fechavam a água e o povo ficava sem. Quando o Sr. Antoninho Mercadante se casou, nesse dia, em homenagem aos noivos, a água ficou aberta até as 10h da noite. A água era fornecida por uma empresa do município pelo efeito de declive. As bombas eram deficientes, então, a água da cidade era pouca. Quando havia enchentes, a água era cortada.

Seu Aníbal Paiva e Tio consertando a Bomba d´água
 Havia um desvio da Central do Brasil para a Serraria Lameirão. Este desvio atravessava a Praça Raul Chaves, onde hoje está o Banco do Estado de São Paulo, bem na frente da Rua Ramira Cabral. O trem parava ali para deixar as toras de madeira muito pesadas. Ele entrava nas serrarias, não só para deixar as toras, mas também para recolher o material já trabalhado para os compradores. Depois ele saía de ré, porque não tinha onde manobrar.


O casarão onde funciona o Carlos Porto , dona Josefina Guimarães da Costa Leitão, viúva do Coronel, vendeu ao Estado por trinta contos de réis, em 1895, mas o Grupo Escolar foi nele instalado apenas em 14 de julho de 1896, depois que fizeram algumas adaptações. No início, o Grupo Escolar ocupou um prédio que foi alugado. Era um antigo casarão, muito bonito, que ficava nos Quatro Cantos. Nele, depois, foi o Pastifício dos irmãos Lencioni.

Rua Alfredo Schurig recebendo calçamento
Eu assumi a direção do Carlos Porto dia 13 de agosto de 1954, que deixei em 12 de agosto de 1976. Fui seu diretor por vinte e dois anos. Eu já entrei como diretor e fui muito feliz. Encontrei um corpo docente muito bom que colaborou muito comigo e do qual eu guardo as melhores recordações. Comecei minha carreira no magistério como professor substituto. Depois ingressei na Fazenda São Martino, de onde fui transferido para o Lamartine Delamare e de lá para o Carlos Porto.”

sábado, 7 de junho de 2014


Memórias do prof. Mário Moraes


Professor Mário Moraes
“Eu nasci em 17 de outubro de 1912, em Jacareí.
Meu pai, Francisco Batista de Moraes era de Freguesia da Escada e mamãe, Patrocínia Pereira de Moraes, era de Santa Isabel.
Meus pais vieram para Jacareí em 1911. Meu pai era viajante. Veio a Jacareí e instalou a casa de comércio “Casa Moraes” na Rua do Carmo, hoje Pompílio Mercadante.
Em 1911, caiu uma tromba d’água na cidade, que inundou tudo. Mamãe ficou apavorada e mudou-se para a Rua Corneteiro de Jesus que, naquela época, chamava-se Rua da Misericórdia. Meu mano mais velho foi arrastado pelas águas e, não fosse pelo Sr. Mourim, ele teria morrido. Eu tive quatro irmãos: Murilo, João, Bolívar Darci e Cássio.
Minha infância foi normal. Tínhamos horário para tudo. À tarde podíamos brincar de corre-corre no Largo do Rosário ou no Largo da Matriz.

Grupo Escolar Coronel Carlos Porto
O primário eu fiz no Carlos Porto, que era o único estabelecimento que havia. Depois eu fui pra Taubaté, estudar no Ginásio Santo Antônio e, depois, para Guaratinguetá, onde fiz o Colégio Normal.
Eu não fui da época do Nogueira da Gama, mas conheci o Dr. Lamartine em Guaratinguetá. Quando acabou o colégio em Jacareí, ele foi primeiramente para São Paulo, onde ficou trabalhando num cartório, mas não se deu bem. Ele nasceu mesmo para ser educador. Aí ele foi para Guaratinguetá, na época de Rodrigues Alves e lá instalou o mesmo ginásio que tinha aqui.

Largo da Matriz  com o coreto original
Dizem que o ginásio acabou por problemas políticos. Com a morte do Coronel Carlos Porto, Dr. Lamartine foi para a política, o que desagradou muita gente. O ginásio começou a perder alunos. Ele já tinha dificuldades em pagar os professores, que começaram a sair, e, com isso, o Ginásio desapareceu.
Eu tenho aqui comigo um livro muito raro, cujo título é “O Gymnasio Nogueira da Gama”.  Editado em 1902, de autoria de F. Antunes da Costa, de onde poderemos tirar dados interessantes como, por exemplo, que em 1893, Jacareí atravessava uma fase bastante precária em sua vida material.


“O “Eldorado do Oeste” atraíra grande parte da população abastada, levando consigo capital e trabalho. A lavoura e o comércio achavam-se em decadência, causando as mais sérias preocupações aos que tinham aqui ficado.”
O Colégio foi inaugurado em 23 de julho de 1893 e, desta data até dezembro do mesmo ano, foram admitidos 25 alunos. De 1984 em diante, a matrícula subiu sempre em progressão crescente. Conforme o colégio progredia, foi se reanimando o comércio. Abriram-se oficinas. Entraram numa prosperidade as indústrias locais. Em 2 de dezembro de 1899, o Colégio Nogueira da Gama , por decreto de número 3.518, assinado por Epitácio Pessoa, foi equiparado ao Ginásio Nacional.

Alunos do Gimnasio Nogueira da Gama, em Jacareí
O fato repercutiu por todos os segmentos da população como um acontecimento único. Jacareí fora elevada à categoria de uma cidade acadêmica, constituindo-se em foco de ciências e letras, onde filhos de outras terras viriam buscar a luz do conhecimento. Assim segue, no livro, a descrição do fato:
“Eram 6h45 da tarde quando o telégrafo notificou: ‘Parabéns Jacareí’. ‘Viva Jacareí’.
O que se seguiu foi indescritível. Centenas de foguetes estrugiram no ar, partindo de todos os pontos da cidade. Um verdadeiro delírio apoderou-se da população. Todos queriam ser os primeiros a levar ao Dr. Delamare o prazer de que se achavam possuídos. Neste dia se prolongaram as festas até altas horas da noite. No dia seguinte, recomeçaram. Eram verdadeiras romarias que se dirigiam ao ginásio. Algumas manifestações tomaram as proporções de uma verdadeira apoteose.
Os operários com blusas suarentas e empoeiradas do trabalho do dia dirigiram-se ao Nogueira da Gama e, em nome deles, fez um pronunciamento o professor Alfredo Fernandes.
A Loja maçônica local, representada por todos os seus membros vestidos inteiramente de preto, também se apresentou no tom mais solene que imaginar se pode.


O comércio, as colônias estrangeiras, os médicos, os advogados, o Grupo escolar Carlos Porto, as escolas públicas, a Sociedade Literária Sete de Setembro, as corporações musicais se solidarizaram e prestaram suas homenagens ao Dr. Lamartine. Devemos lembrar os nomes de Carlos Porto, Manoel Jacinto, Nunes Ferreira, como de extremos colaboradores do Dr. Lamartine.”
Carlos Frederico Moreira Porto trabalhava no Rio de Janeiro. Com a morte do pai, ele veio tomar conta dos negócios da família. Ele trabalhou muito por Jacareí. Foi ele quem instalou o Grupo Escolar Carlos Porto, quando foi deputado. No enterro dele, colocaram crepe negro em todas as lâmpadas da cidade e Jacareí praticamente parou em sua homenagem. Ele era um grande chefe político e deputado pelo Vale do Paraíba. Ele ia instalar aqui a escola Normal quando faleceu.


(Continua)

domingo, 1 de junho de 2014


Memórias colonização japonesa em Jacareí: Casamentos

Foto de Casamento de Jayme Takume Tanisho
Os imigrantes japoneses que se fixaram, inicialmente, em Jacareí vieram de outras localidades do Brasil. Dessa forma, já vieram com suas famílias constituidas. Em sua maioria casaram-se sob a forma de miai, intermediado pelo nakôdo, outros vieram casados do país de origem. Aqueles que vieram solteiros, como no caso dos cotiaseinens, as noivas foram enviadas do Japão ou arranjadas por meio de empregadores ou amigos.às vezes as noivas vinham com os pais dos jovens na ocasião da viagem deles para o Brasil. Esses casamentos ocorriam sempre entre imigrntes ou decendentes. Os noivos ajudavam nas despesas do enxoval. Os preparativos para o casamento demoravam em geral três dias. Para a festa, que era ralizada na casa da familia do noivo eram convidados todos os vizinhos e as iguarias, preparadas pelas senhoras do bairro, eram servidas em abundância. Como a casa, normalmente, não obrigava mais do que uma dezena de pessoas, os casamentos eram realizados nos galpóes ou nas barracas construídas. Com a construção dos Kaikans, os casamentos passaram também a ser realizados no local, pelo menos até a década de 70. Depois de casados, geralmente moravam na casa dos pais até adquirirem uma propriedade e construirem a sua própria moradia. Na cerimonia do casamento, os noivos utilizavam trajes brasileiros, mas seguiam os rituais japoneses. ( fotos e matéria retirada do livro Caminhos da Imigração Japonesa em Jacareí, de Júlia Naomi Kanazawa, 2004)
Kunitoshi e Koto Misawa, Tiyo Misawa e Naohiro Tsukada