segunda-feira, 27 de janeiro de 2014


1932 – A Revolução Constitucionalista

1932 Praça do Patriaraca em São Paulo foto do álbum de família de Neta Mello,
cedida especialmente para o livro Jacareí tempo e Memória
foto cedida especialmente para o livro Jacareí Tempo e Memória por Neta Mello
do álbum de sua família

“Tais foram os fatos que eu vi; os fatos em que tomei parte; os fatos que por meu comando se realizaram; os fatos de que participei como chefe e como testemunha; os fatos que me conduziram à luta, à prisão, ao exílio, á perda de amigos, de posições e de bens; os fatos de que me recordo como os melhores de minha vida. Se eu pudesse muda-los, não os alteraria em nada, e os sofreria de novo; se pudesse, novamente os provocaria. Porque só com este exemplo, renovado e muitas vezes renovado, até o sacrifício final, teria dado ao meu país o que de melhor resta de mim :o amor a seu povo e à liberdade a que ele tem direito.” (Euclydes Figueiredo, 1981)
Antes de falar sobre a Revolução Constitucionalista de 1932, é preciso voltar um pouco no tempo para compreender como evoluiu a situação política no Brasil, até chegar a este episódio. Ele foi um dos maiores movimentos armados da história de nosso País, entendido por alguns historiadores, inclusive, como uma breve guerra civil.
 Durante a República Velha (1889-1930), formou-se uma aliança entre todos os estados brasileiros que definia que São Paulo e Rio de Janeiro, os dois mais ricos e influentes do Brasil, teriam o direito de escolher o Presidente da República. Seus representantes alternavam-se, desde então, no poder, num movimento que ficou conhecido como a "política do café com leite". Em 1930, porém, o presidente Washington Luís, representante dos paulistas, rompeu essa aliança e indicou outro paulista, Júlio Prestes, que era governador de São Paulo, como seu sucessor. Júlio Prestes venceu as eleições, mas nem chegou a ocupar o cargo, pois as oligarquias mineiras não aceitaram o resultado. Rio Grande do Sul e Paraíba articularam um golpe de estado e colocaram Getúlio Vargas no poder.

Getúlio, típico político do período entre guerras, era autoritário e gaúcho. Ele representava a maior e a mais preparada elite militarizada do país, com enorme sentimento patriótico, inexistente entre as oligarquias cafeeiras paulistas. Getúlio foi conduzido ao poder, em 3 de novembro de 1930, pela Junta Militar que depôs Washington Luís. O novo presidente veio com uma nova proposta de modernização do país, mas começou a promover as mudanças de maneira autoritária, sem consultas eleitorais. Getúlio Vargas fechou o Congresso Nacional, anulou a Constituição de 1891, que impunha o federalismo como sistema político, e depôs governadores de diversos estados, passando a nomear interventores. As medidas desagradam profundamente as elites paulistas tradicionais. Políticos ligados à oligarquia paulista (cafeicultores e pequenos empresários), mais especificamente ao Partido Republicano Paulista (PRP) e que haviam sido retirados do poder pela Revolução de 1930, passaram a trabalhar em oposição ao governo de Getúlio. Em 1931, reuniu-se a essa elite deposta um grupo de políticos e intelectuais “mais moderno". Ele exigiu do governo a criação de uma nova carta magna que regesse a legislação do país - algo que Vargas vinha adiando cada vez mais - além de eleições gerais para presidente da república.
Ao mesmo tempo em que se formava esse grupo opositor, fortaleciam-se, em São Paulo, os chamados tenentistas, constituídos não apenas por militares, mas também por civis que agiam sob sua liderança. O tenentismo foi um movimento político militar que fez oposição à aliança do café com leite. Profundamente inspirados pelo Positivismo, acreditavam que somente um governo militar poderia levar o Brasil a ter a tal “ordem” que resultaria no tal “progresso”. Criticavam o voto de cabresto e todos os absurdos do regime oligárquico. Seu slogan político era “a verdade eleitoral”. O primeiro levante tenentista ocorreu em 1922 (Levante do Forte de Copacabana) Em 1924 outros dois importantes levantes eclodiram: um em S. Paulo e outro do Rio Grande do Sul. O encontro das colunas paulista e gaúcha (nos arredores da Foz do Iguaçu) gerou a famosa Coluna Prestes-Miguel Costa. Depois do fim da Coluna, em 1926, os tenentistas se exilaram em países vizinhos. Em 1930 eles acabaram se dividindo em dois grupos: uns passaram a apoiar Luís Carlos Prestes, que tinha se filiado ao Partido Comunista Argentino, e outros, Getúlio. Neste cenário eram constantes as brigas de rua entre os estudantes do Largo São Francisco (que faziam parte das elites intelectuais que queriam uma nova Constituição para o País) e os getulistas.
No dia 23 de maio, do confronto entre esses grupos resultou a morte, em praça pública, dos jovens Martins, Miragaia, Dráuzio e Camargo. Essas mortes foram o estopim que deu início à Revolução Constitucionalista no dia 9 de julho de 1932. O movimento então, emprestando as letras dos nomes dos rapazes mortos, passou a chamar-se MMDC. Com a ajuda dos meios de comunicação em massa, o movimento ganhou apoio popular e mobilizou 35 mil homens, pelo lado dos paulistas, contra 100 mil soldados do governo Vargas. A Revolução teve apoio de amplos setores da sociedade paulista. Pegaram em armas intelectuais, industriais, estudantes, outros segmentos das camadas médias e políticos ligados à República Velha ou ao Partido Democrático. No dia 9 de julho de 1932, o conflito armado organizou seus primeiros passos sob a liderança dos generais: Euclides de Figueiredo, Isidoro Dias Lopes e Bertoldo Klinger. O plano dos revolucionários era empreender um rápido ataque à sede do governo federal, no Rio de Janeiro, forçando Getúlio a deixar o cargo. No entanto, a ampla participação popular e militar não foi suficiente para fazer frente ao governo central. Na retaguarda, o povo se uniu para ajudar em tudo que era necessário: surgiram voluntários civis aviadores, para pilotar aviões, outros para lutar como soldados ou como padioleiros, que recolhiam feridos levando-os da frente de batalha para a retaguarda, mulheres costuravam uniformes, faziam pães e preparavam os alimentos para serem enviados aos combatentes.
Entre os paulistas, havia uma esperança de que outros estados viessem em apoio ao governo de São Paulo, conforme prometido, o que não aconteceu.  Durante três meses, eles lutaram sozinhos contra as tropas Getulistas. Foram batalhas sangrentas, encerradas, em 2 de outubro daquele mesmo ano, com a derrota militar dos paulistas. Moralmente, porém, em termos de denúncia política, o movimento foi vencedor, porque logo depois do término do conflito, o governo federal convocou eleições para uma Assembleia Constituinte, que promulgou a Constituição brasileira em 1934. Foi também quando, pela primeira vez no país, as mulheres participaram do processo eleitoral. O armistício que pôs fim à Revolução de 32 foi assinado em Aparecida, no Hotel do Fidêncio. (segue no próximo post)



4 comentários:

  1. Belíssimo texto e narrativa. Adorei. Meu pai tinha 6 anos nessa época mas contava em detalhes as coisas que via acontecer. Coincidências a parte, meu irmão nasceu dia 23 de maio, meu pai tambem faleceu num 23 de maio e eu nasci no dia 09 de julho (1950).
    Gostaria muito de ter guardada essa historia mas não dá para copiar de seu blog. Se importaria de me passar por e-mail (depois de publicadas por voce é claro) quero guardar para meus netos.
    Parabens... abraço
    Rita Zambelli

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  2. Muito obrigada, Rita Zambelli por seu e-mail e seu interesse. O texto solicitado já lhe foi enviado por e-mail. Continue com a gente! Grande abraço!

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  3. As armas compradas por S.Paulo no Canadá foram retidas nos portos dos USA - fato este que causou muito prejuízo a S.Paulo. O Mons. Luiz de Abreu participou do combate do Túnel em Itajubá, estava disfarçado de soldado, feito prisioneiro rebelou-se dizendo que S.Paulo tinha armas e homens para ganhar a revolução. Foi interpelado por um soldado que passou a agredí-lo, porém foi reconhecido pelo Gal Góis Monteiro, que disse a ele " Pe. eu sei quem é o senhor, saiba que eu comando o comandante da Força Pública Paulista há um mês, ele foi comprado por mim." Estas foram as palavras do Mons Luiz de Abreu a meu tio Mons Octaviano de Carvalho Lamaneres em Pouso Alegre, quando passou como prisioneiro. As munições que precisávamos foram jogadas no Rio Camanducaia. Portanto perdemos a revolução.

    Jose Alcides Porto Rossi (recebi via facebook)

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  4. - Existe um livro do Ga. Góis Monteiro - Minhas Memórias - onde ele diz claramente, embora entre linhas, que se S.Paulo não houvesse parado em Barra Mansa e tivesse entrado no Rio de Janeiro ele teria aderido à revolução e deposto o caudilho gaúcho.Um dia ainda faremos isso.Conduzo não sou conduzido era o lema de 1932 nas palavras do Tribuno de 1932 Ibraim Nobre. José Alcides Porto Rossi (via Facebook)

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